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Depois de Ver... Memórias

A memória é uma coisa curiosa. Costuma pregar peças na gente das formas mais estranhas. Pegadinhas que nos embaraçam de toda maneira, desde o “branco” durante a prova de biologia, até no lembrar sem querer de uma piada engraçadíssima durante o momento mais emotivo do enterro daquela tia-avó distante.


E foi pensando em minhas memorias de infância, provocado por uma professora na aula de português, que percebi que boa parte delas, são tempos distantes e em terceira pessoa. Isso mesmo que você está pensando, tenho muitas memórias nas quais me vejo como um ator em um pequeno filme. Talvez, porque muitas delas foram construídas baseadas nas dezenas de vezes que ouvir minha mãe, e pessoas próximas contando.


Filho de pais separados, fui criado com minha mãe, três primas mais velhas, duas moças que trabalhavam no salão com minha mãe e minha babá. Diria que de um modo muito positivo essas 7 mulheres foram parte muito importante na minha vida. São 7 mães que tenho e carrego-as com amor no coração.


Esse nicho familiar cheio de cuidado maternal, a educação sempre foi um dos focos na minha formação. Entre ajudas e exigências. Lembro-me perfeitamente de receber ajuda de uma delas para consultar a Enciclopédia Barsa, e realizar uma atividade que exigia a descrição de todos os presidentes brasileiros, devia ter por volta dos meus 6 a 7 anos.


Já no rol das memórias em terceira pessoa que tenho quase certeza que não são minhas, minha mãe conta como eu “relia” para as clientes delas, no salão de beleza, os quadrinhos que ela lia para mim. E impressionava a todas, que achavam que com tão pouca idade eu já conseguia ler.


Meu processo de formação como leitor foi também cheio de altos e baixos. De ávido leitor de quadrinhos, à detestar os clássicos obrigatórios das aulas de literatura. O encanto dos livros da coleção Voo Livre era gigante, como principal lembrança, solucionei um sequestro, prendi os bandidos e salvei a garota, junto ao Gil, garoto médio (descrições do autor) com quem muito me identificava, era a “Prova de Fogo” propostas por Pedro Bandeira.


Mas, por contraponto, descobri clássicos sozinho nas prateleiras de casa, e experimentei uma incrível jornada pelos sertões brasileiros, pelo maravilhoso ‘Vidas Secas’ do Graciliano.


Descobri já no fim da adolescência que gostava de ler. Já que a leituras de quadrinhos até então ignoradas pelas professoras, que chegavam a dizer que quadrinhos não eram “leitura de verdade”. E isso só mudou quando na 8º série fui apresentado aos dois gaúchos que vieram a se tornar meus autores favoritos, Luiz Fernando Veríssimo e Mario Quintana. Entre o cronista e o poeta, me encontrei e encontrei outros gigantes, Veríssimo (o pai), o melancólico Baudelaire, Pessoa, Machado, a poesia em forma de música de Caetano e Chico. E percebi que os clássicos que tanto me repudiavam eram preciosidades, com nuances que minha mente jovem não tinha talvez maturidade para perceber e degustar.


Hoje comemoro meu gosto plural de leitura, jornais diários, crônicas, quadrinhos, romances policiais, fantasia. Todos fazem parte do meu cotidiano de leitor. E como memórias pregam peças, é comum misturar, esporadicamente, enredos dos best sellers de Dan Brown, achar alguns crimes parecidos demais com alguns descritos por Agatha Christie, ou mesmo achar que o absurdo mundo de Orwel descrito em 1984 pode não ser tão impossível assim quando olhamos nossa sociedade atual.

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